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AS POLÍTICAS EDUCACIONAIS DE CONSTRUÇÃO DE PROFESSORES ESCOLARES E A AÇÃO DA PERFORMATIVIDADE.
Susana Schneid Scherer

Última alteração: 2017-03-17

Resumo


 

 

RESUMO: Este estudo apresenta a Tese em desenvolvimento no Curso de Doutorado em Educação da Universidade Federal de Pelotas em qual se tem como objetivo investigar o trabalho docente no liame das políticas educacionais. Procurando-se articular direta, relacional e continuamente, os desdobramentos e articulações entre elementos micro-macro sobre o trabalho de professores público-escolares vêm-se enfocando a ação da performatividade como tecnologia e cultura proposta a política estatal pelo projeto capitalista global, flexível e competitivo.

 

PALAVRAS CHAVES: Estado; tecnologia política; trabalho docente.

 

INTRODUÇÃO.

Este ensaio apresenta a proposta de Tese de Doutorado em Educação da Universidade Federal de Pelotas, que tem em vista investigar processos de construção docente em professores público-escolares no âmbito das políticas educacionais. Procura-se articular direta, relacional e continuamente, elementos micro-macro influentes sobre o trabalho de professores público-escolares, sobretudo, em face da pouca produção acadêmica deste enfoque (OLIVEIRA, 2004).

A partir dessa postura, tem-se como objetivo identificar efeitos produzidos pela estratégia da performatividade docente sobre os professores de escola a luz de uma gestão gerencialista de Estado. Isso porque, o estudo vem assumindo, centralmente, as inferências do movimento econômico produtivo do mercado capitalista, que, a partir de um momento de crise que se iniciou nos anos 1990 e em continua fortificação no correr dos anos 2000, pauta estratégias de superação desta crise através de modos de globalização, neoliberalismo e reestruturação econômica que redefinem o Estado e sua forma política (PERONI, 2010). Que, especialmente, no caso da docência é levado a efeito por meio de duas principais tecnologias de reformação: um tipo de gestão gerencialista que introduz a lógica empresarial de mercado no setor público (CLARKE e NEWMAN, 2012); e a performatividade como método de transformação da cultura, dos valores e das práticas de escolas e docentes (BALL, 2001; 2005).

O cerne em desvendar efeitos da performatividade docente enquanto tecnologia política educacional desvelada por parte do Estado se embasa no conceito de performatividade desenvolvido por Ball (2001; 2005) e embasado em Lyotard. E que no Brasil teve um estudo de Ball et al (2013) sobre o tema, e vem sendo, mais especificamente, sido base em estudos de Hypólito (2010) e Oliveira (2004). Na verdade, tem-se percebido, ao mapear o campo de pesquisas e produções sobre esta temática, que a concepção de performatividade docente ainda é pouco trabalhada nacionalmente.

 

METODOLOGIA.

Ancora-se no horizonte investigativo de Ball (2009) sobre as políticas educacionais, o qual enfatiza os processos e as relações que estabelece entre e no liame macrossocial e contextual e o que se efetiva na esfera micro institucional da escola e seus sujeitos. Entendendo que uma política não é algo estático, linear, ou neutro, mas um campo de disputa que produz e é produtor de orientações, Ball e Mainardes (2011) apresentam a ideia de um “ciclo” analítico para investigação de políticas educacionais com três contextos nucleares: (1) da prática, (2) da produção; (3) de influência política, que, no entanto, relacionam-se um com o outro.

GERENCIALISMO E PERFORMATIVIDADE: TECNOLOGIAS POLÍTICAS DE (DES) CONSTRUÇÃO DOCENTE.

Ao observar o cenário macrossocial do capitalismo, em um período de crise, nota-se o avanço da combinação entre três estratégias de superação: o neoliberalismo, a globalização e a reestruturação produtiva (MÈSZÁROS, 2013), que à medida que “redefinem o papel do Estado, principalmente para com as políticas sociais [...] entre elas a política educacional” (PERONI, 2010, p.1) impactam na política para com docentes.

Ball (2001) vem desenvolvendo a tese de que há o avanço de um “novo paradigma de governo educacional” simbolizado, sinteticamente, por uma “única concepção de sociedade” globalmente competitiva e que reflete no esvaziamento das concepções políticas específicas sociais de cada Estado-Nação nos campos econômico, social e mesmo educativo. No nível micro, isso induz os diferentes Estados-Nações a buscarem novas tecnologias políticas para modificar as práticas e as subjetividades, sobretudo, de docentes; para que, então, no nível macro, estas disciplinas gerem as bases para um novo “pacto” entre Estado e mercado/capital que concretize novos modos de regulação social que operem por dentro do Estado (BALL, 2001).

O que Ball (2001) vem depreendendo é que as estratégias suscitadas de “coação” à lógica competitiva transformam a constituição dos professores na totalidade dos valores e dos modos de ser, através de indução de uma forma de desempenho performático. A performatividade diz respeito a uma tecnologia, cultura e método usado que regulamenta julgamentos, comparações e demonstrações como meios de controle, atrito e mudança. Ela exprime “os terrores (soft e hard) de desempenho e eficiência” – o que significa: “seja operacional (ou seja, comensurável) ou desapareça” (BALL, 2005, p.544). O desempenho funciona como a medida de produtividade, o resultado e a exposição da “qualidade”, compreendendo, para Ball (2005), o aspecto funcional e instrumental do conhecimento transformado em mercadoria e, aonde os professores veem seus compromissos humanísticos reduzidos “a representações grosseiras que se conformam à lógica da produção de mercadorias” (p.549).

A cultura da performatividade tem sido incutida na alma do professor combinada a introjeção de uma forma de gestão gerencial e empresarial por dentro do setor público (CLARKE e NEWMAN, 2012). Essa forma administrativa se constitui por uma concepção de qualidade pautada em desempenho e metas, a qual combinada à performatividade atua como a dupla das irmãs perversas de contos de fadas: definindo “estados de desempenho e perfeição que jamais podem ser alcançados; pela ilusão que se desfaz de uma finalidade a ser modificada. Elas são amargas, implacáveis, incansáveis e impossíveis de satisfazer” (BALL, 2005, p.546). Em que pese de uma aparente racionalidade e objetividade, a performatividade atingindo profundamente a percepção do eu e do próprio valor do professor deixa em pauta a completude de dimensões emocionais com incitações de sentimentos de orgulho, culpabilidade, vergonha e inveja.  Até porque nas desconcertantes imensidões de performances, comparações e competições em quais os professores passam a operar a satisfação da estabilidade se torna cada vez mais fúlgida e os propósitos mais contraditórios, as motivações ficam borradas e a autoestima escorregadia.

A performatividade e o gerencialismo conseguem, por fim, o controle do que o professor faz ou vem a fazer ao funcionarem como um tipo de “ventriloquismo”, propondo falar e dizer aos professores o que e como lecionar. Ao fornecerem maneiras buscando descrever o que é feito na sala de aula, as possibilidades autônomo-criativas da ação docente ficam reduzidas, de modo que se consolida, enfim, uma total alienação do “eu” docente, e a partir do que também resultam práticas e relações que são inautênticas e impotenciais de discursos e ações filosóficosociais socialmente justas, especialmente, pela essência dos motes e princípios mercantis circundantes a estas duas tecnologias de reformação docente e escolar, isto é: essências de corte competitivos e individuais.

 

REFERÊNCIAS:

BALL, S. Diretrizes Políticas Globais e Relações Políticas Locais em Educação. Currículo sem Fronteiras, v.1, n.2, Jul/Dez, p.99-116, 2001.

 

_____. Profissionalismo, Gerencialismo e Performatividade. Cadernos de Pesquisa, v. 35, nº. 126, set./dez, p. 539-564, 2005.

_____. Entrevista. Um diálogo sobre justiça social, pesquisa e política educacional. Educação e Sociedade, v.30, nº, 106, p. 303-318, 2009.

 

___; et al. A constituição da subjetividade docente no Brasil: um contexto global. Revista Educação em Questão, v. 46 n. 32, p. 9-36, 2013.

 

_____; MAINARDES, J. Políticas educacionais: questões e dilemas. São Paulo: Cortez, 2011.

 

 

CLARKE, J; NEWMAN, J. Gerencialismo. Educação e Realidade, v. 37, nº. 2, maio/ago, p. 353-381, 2012.

 

HYPÓLITO, A. M. Reorganização Gerencialista da Escola e Trabalho Docente.

Educação: Teoria e Prática, v. 21, n. 38, 2011.

 

MÉSZAROS, I. Para além do Capital. São Paulo: Boitempo, 2013.

 

OLIVEIRA, D. A Reestruturação do Trabalho Docente: Precarização e Flexibilização. Educação e Sociedade, Campinas, v. 25, n. 89, p. 1127-1144, 2004.

 

PERONI, V. As redefinições na relação público/privado e as implicações para a democratização da educação. Congresso Sul-brasileiro da ANPAE, p. 1-17, 2010.